terça-feira, 6 de abril de 2010

Não sei quem ser. Não sei nem se quero ser mais que o pecado de quem, em mim, o vê. Ou a mão que esgravata o fundo da alma, mais que vazia, gastando-se em ofegantes ignições.
Vivo na rua e sou menos que a rua. Não sei sequer se o cheiro etílico do meu vómito faz de mim crente de que inexisto. Não sei se quero saber. Não me perturba se o tilintar leve da consistentemente leve moeda encomenda a deus, por intermédio da sombra que pareço arrastar pela rua, a expiação dos pecados de quem do seu peso se livra e do meu se finge carregar, em troca.

A rua sugou-me a alma. A rua tirou-me o nome e a cara. Destituiu-me da humanidade, de progénie e razão. Depois, foi meu pai e minha mãe e toda a minha espécie. A rua deixou-me ser o incómodo que dá valor à casa de quem por mim passa e se incomoda.

Não sei como me quero. Nem se me quero mais que um cheiro a suor e urina e a sola de sapato. Não sei para que quero mais linguagem que o grunhido que o frio e o bagaço puseram na minha boca, nem mais memória que a que me leva ao canto mais abrigado e com o chão menos duro.
Não sei para que sou, nem nunca me consegui decidir a deixar de ser.
Isto. É o que acho que sou quando mo dizem mas já não me recordo.
Não sei para que quero esquecer nem o que quero esquecer. Quase que nem sei já o tanto que doía poder lembrar.


Peço desculpa pela(s) ausência(s) prolongada(s). E peço desculpa pela presunção do princípio de que algum de vocês sente o menor desalento com isso lol. Como já disse, prometo que vou tentar publicar mais assiduamente.

Gostava de vos deixar um pensamento que tive hoje. Não olhem de baixo para o ghandi ou jesus cristo ou einstein, seja quem for que admirem. Acreditem e esforcem-se o suficiente para os chamarem de colegas :)

11 comentários:

m disse...

Fiquei momentaneamente presa na primeira frase. É um tanto ou quanto mística e sábia. Julgo que há sempre uma cessante dúvida que nos berra ao ouvido: quem somos? Sim, quem somos. E alguém uma vez jogou pela janela fora esta sentença: «é notório que somos visivelmente inspirados pela mecânica das memórias, passamos o tempo a ranger os dentes em busca do essencial da nossa personalidade.» e depois um «ou quê?», como se esperasse uma troca directa de favores impossíveis. Ou talvez vez minimamente (!!, sim) concretizáveis. Sabes, o pecado que alguém pode ver em ti não deixa de ser discutível, aliás, como todas as qualidades ou defeitos que alguém vê noutro alguém. Acontece que isso não faz com que tenhas de abandonar o castelo que construíste, dia após dia, ano após ano. Sempre me disseram: quando alguma pedra da nossa torre cai, não temos outro remédio se não melhorá-la e voltar a pô-la no sítio. Só tens que ter em atenção uma premissa... ver o quanto te adaptas a essa mudança, se estás pronto para enfrentar o que quer que seja sabendo previamente que não terás as peças do xadrez todas no tabuleiro; ou pelo menos na mesma disposição.

A rua sempre foi palco de grandes movimentações. De grandes momentos. De grandes sentimentos. Melhor que tudo isso junto, de grandes pessoas. Se formos bem a ver, há uma ligação inquebrável entre a arte e a rua e as pessoas e a arte e a rua e as pessoas. Como um triângulo fortíssimo cujos vértices são uns picos frageis, mas suficientemente fortes para causar qualquer ferida de quem tem a alma torta. Mas, penso ser aí que reside o maior acolhimento que alguma vez podias encontrar: as linhas das paredes bambas de uma cidade que se forma a olhos vistos, sempre na iminência de ruir mas que se mantém de pé, austera, balançando ao ritmo cardíaco de quem nela vive... ou passa. É isso que faz da rua algo teu; partilhável dependendo do espírito. Do teu espírito. Um espelho da tua alma; boa alma, a propósito. Não vejas a rua como um pequeno caixote onde se atafulham brinquedos velhos e se reclamam por novos. Há trocas que por mais que julguemos possíveis, operam-se apenas na nossa mente porque na realidade, são sopros leves da voz da inconsciência. Essas mesmas trocas, não são justas, e mesmo esquecendo as questões de justiça, essas trocas não são nunca realizáveis. E porquê? Quer queiramos quer não, há um factor fundamental nas nossas vidas: factor tempo. É ele que se molda às nossas perspectivas. É ele que determina milhentas das nossas acções. É ele que tem o seu ponteiro apontado para uma direcção, apesar de não ser o dominante. Isto é, é ele que nos traz as pessoas. E são estas pessoas que nos pisam o coração. De forma agradável, de forma suave; definitiva e unicamente bela. Desta feita nunca há abandonos. Nunca há trocas. Nunca há nada que apague isto!

m disse...

O objectivo, por muito pausado que esteja, é dar continuidade ao desenho feito por dois lápis comandados por duas pessoas diferentes mas que um dia ligaram-se emocionalmente pelo beijo de um olhar. O segredo está aí. E só aí. Daí ser perfeitamente normal sentires um grande abanão do teu ''berço'' e da tua fonte segura, do teu porto de abrigo e vacilares entre o que queres, o que não queres e o que nem sabes se queres. (A inconstância sempre fez parte das melhores pessoas!)
A recordação é a mistura de tudo o que te foi mostrado. Ou melhor, do que foi sentido. Um dia uma pessoa muito especial disse-me que há uma grande diferença entre o que está à vista e o que é sentido e, por isso mesmo, não há que ter medo em dar forma ao conteúdo. Ou conteúdo à forma... tanto faz. Nem sempre o faço. Pronto, para ser sincera, nunca o faço. No entanto, não esqueço as palavras, não esqueço os gestos, nem esqueço as figuras que carinhosamente coleccionei e guardei-os num sítio onde ninguém mas pode tirar: cá dentro (L). E venham os ventos que vierem, as tempestades, as bonanças, a chave só eu a tenho. E por mais perdida que eu esteja, por mais escura a nuvem que paira, ainda hoje, ainda neste momento, sobre a minha cabeça, sei que num instante ou noutro, os meus pensamentos andam de mãos dadas com os da pessoa em questão, com os da pessoa que levo comigo para todo o lado e que.. sinto falta, mesmo muita falta! As tentativas nem sempre são visíveis, mas tudo pode funcionar como um mapa... Vejamos os sítios, vejamos as ligações, vejamos o que de mais belo há, vejamos as rotas, vejamos tudo... e no fim, lembremo-nos disso. E só Deus sabe como o esquecimento não costuma pregar-me partidas...
E eu continuo a admirar as pessoas mais improváveis. E alguns sim, são colegas. Outros continuam, inevitavelmente, num patamar acima.

Bonito texto, beijo*

Maria Francisca disse...

Não saber quem ser não é errado. Até porque nem escolhes quem és, só moldas o que já és ao que vais vivendo.
É provável que a conheças, visto que me conheces e até sabes do nome Gigi...
Eu percebi que já não vais dizer quem é, gostava era só de saber o porquê desse mistério. Mas enfim...
Respeito.

S* disse...

Dou o meu melhor em tudo... mas acho sempre que nunca vou estar à altura.

Andesman disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
. disse...

Andesman:

Hoje é só para deixar um abraço cá do "pirata" ao meu amigo, o ENORME ...

este comentário foi censurado pq identificaram o autor deste blog x)

obrigado amigo pirata, da próxima tem é que ser anónimo ahah

. disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Miss Murder disse...

Nunca sei o que comentar em posts profundos... acho que sou demasiado vazia XD

Mas gostei da ideia de chamar os grandes de colegas...

Andesman disse...

Imperdoável!!! Eu não perdoo a este pirata que sou eu, tão grave falha. Isto não foi uma distracção foi uma estupidez. Um "pirata" não tem morada nem identidade. Um "pirata" é "pirata", pronto! E eu que já me tinham feito uma "pirataria" igual, e protestei com força, acabo a fazer o mesmo. Com as minhas desculpas um abraço "pirata".

Barbara disse...

Você está sendo a casa, a comida , a manta, o chão de si.

na
cara do texto, isso.

Precisa de que mais?
Nem nada nem ninguém.

Já tem a si. E por mais que nos enganemos, é suficiente.

Unknown disse...

olá bom dia passei apenas para dizer olá e que os teus post são mesmo muito bons e eu gosto muito de lê-los...