Ele viu-a e foi o suficiente. Seja quando for que se venha a esquecer dela.
Não a ama, mas há alguma coisa nos olhos e quer defini-la. Mentiu demasiado para gostar de segredos. Ou então, vive por eles e morre com eles. E ainda assim, tem que a descobrir, que a analisar, tem que a conhecer e ter a certeza de que não sabe o que quer dela.
Não faz sentido que uma aventura em Paris se adeqúe quando um beijo é íntimo demais, que o mais vulgar dos encontros faça desesperar por mais um. Há alguma coisa ali. Há um sorriso triste e um segredo para descobrir. Há uma genuinidade em que não quer acreditar e uma vontade de continuar incrédulo. E não a ama. Nunca teria medo de admiti-lo, muito menos agora.Não a ama, mas há alguma coisa nos olhos e quer defini-la. Mentiu demasiado para gostar de segredos. Ou então, vive por eles e morre com eles. E ainda assim, tem que a descobrir, que a analisar, tem que a conhecer e ter a certeza de que não sabe o que quer dela.
Há uma voz que não se cala, na occipitalidade de um murmúrio, que insinua coisas absurdas.
Para quem se apercebe, a diferença entre ser corajoso e não ter o que perder reside no medo, não é senão um motivo ou a falta de motivo, para cada uma das duas causas. Apesar de terem o mesmo efeito, para quem se apercebe, a diferença é surpreendente.
Se a coragem pede que se assuma o que se tem a dizer, ele escolhe todos os dias a cobardia. Todos os dias, menos neste.
Talvez não o admita (o amor, digo) porque tenha algo a perder. Talvez esteja a pensar a sério afastar a própria diferença, se isso impedir que a sua aparente psicose a assuste. Ela, para que entendamos a quem me refiro. Ela fumou-o de um trago e deixou-se sentada, porque é isso que ela faz. Ela foi natural, foi directa e normal e mexeu-se do seu lugar apenas o suficiente para lhe mostrar que viu e não se comove, um pouco como um filme de sábado à tarde que não faz trocar a noite de dança por um serão de sequela.
A primeira coisa que aprendeu sobre ele é que sofre de uma constante falta de atenção. Ou resistência à atenção. Que o seu ego tira o chapéu e rouba a palavra à indignação, de cada vez que lhe chamam esquisito. Aplausos para o triste palhaço. O número foi engraçado, o circo acabou. Ela espera agora que ele lave a cara e tire as tintas.
O que ela não sabe é que não eram tintas. As tintas são agora, e é agora que ele finge, quando o mundo todo está a ver. O circo começou quando saiu da intimidade da tenda. O que ela não sabe é que há quem precise de mentir para falar verdade. Mesmo que não minta.
E, por detrás das lentes azuis que ela usava, ele viu-lhe uns olhos bem bonitos, e desejou do fundo do coração que lhe revelassem mais que o medo irremediável que ela sente de palhaços.