domingo, 7 de março de 2010

das doenças psicológicas (capítulo 3)

Nota: a tentativa de suicídio é uma tentativa forçada de adormecer. o suicídio é morrer. e morrer é arriscar-se a não poder sonhar, nunca mais. a questão é que uma tentativa bem sucedida de suicídio seria o equivalente a adormecer. assim, uma pessoa com capacidade para se suicidar, teria capacidade para adormecer. só é pena que, depois de se morrer, não se possa voltar atrás. afinal, sempre teria sido possível, não é?
é natural não estares a perceber. esta nota devia, provavelmente, estar no fim, mas senti que devia pôr aqui. afinal, é demasiado mórbido acabar um texto a falar de suicídio, ou não? logo voltas atrás e percebes.


A tristeza é um ponto de interrogação. Parar é morrer.

Ai de mim se me entristeço. Ai de quem, como eu, afirma em frente e linha recta, de olhos fechados e coração aberto, bombardeando de passos apressados o chão que está certo de lá estar. E recita épicos poemas de inchar o peito, aeito mar e rocha e névoa adentro, e desbarata o desconhecido com sabres exclamados em voz de trovão!
(esperemos que sempre em frente, e a correr)

porque parar,   "parar é morrer"

o hercúleo coração vem com olhos de pandora, meus caros.
Ai de mim se me entristeço. Ai de quem, como eu, se habitua à certeza linear. Baralham-nos, as curvas. E a tristeza é um ponto de interrogação. Esconde, na sua sinuosidade, a incerteza, e começamos a duvidar do chão. E é no momento em que os olhos entreabrem que o coração se encolhe. A vista toca o mundo e a névoa do sonho condensa numa gota e cai na terra. E nós caímos com ela porque, no mundo, não há escadas para o céu.
Porque aprendemos que o céu é em cima, disse a geografia, e é difícil ir para cima por causa da gravidade, disse a física, e será que o céu existe?, disse a filosofia, e já estragou tudo. Porque com a razão, vem a pergunta. Com a pergunta, vem a dúvida. Com a dúvida, a hesitação. E quando hesitamos, paramos. E, pela última vez, parar é morrer. E para morrer, há muita gente.
Então? Então escrevo um aviso para quem quiser ler, depois adormeço outra vez e sonho outra vez e corro o mais depressa que puder.

Ai de mim se me entristeço. A tristeza faz acordar. A depressão faz perder a capacidade de tornar a adormecer. E isso é parar.

Sonha e descobre onde os sonhos te podem levar :)

7 comentários:

m disse...

(pré-aviso: agora fiquei baralhada e não fiquei de todo, simultaneamente;
aviso: ignora o pré-aviso; é a ''velha base'')

Pois bem, a posição da nota é, a meu ver, bastante relativa porque devido ao assunto do texto, não importa em que momentos, essa questão vem sempre ao de cima (invariavelmente). Não sei muito bem se podemos relacionar suicídio à «tentativa forçada de adormecer». Quer dizer, poder pode-se mas continuo a achar que há assim um quê de mistério nisso. E o óbvio está aí mesmo. De qualquer forma, literalmente, é uma palavra que assusta um bocado mas isso não significa que tenhamos medo dela ou que ela nunca tenha feito parte dos nossos pensamentos. Neste momento, mentiria se dissesse que não, independentemente do medo que a morte me provoca ou melhor, independentemente do abandono forçado de qualquer-mundo-maravilha-com-pessoas-ainda-mais-maravilhosas-que-habitamos. (Mais uma vez, isso é relativo.) E por muita xunguisse que isto seja, vejo o suicídio como algo natural mas incompreensível e podes chamar-me egoísta ou o que quiseres, mas é simplesmente estúpido cometer tal acto, quer seja em que estado que nos passe pela cabeça. É simplesmente parvo deixar toda uma vida (quer tenha sido bem aproveitada ou não!) para trás por um acto de ''rebeldia'' (desculpa) ou por desespero. Nada justifica a morte, na minha opinião. Mas isso é outro assunto. Ainda atentando na nota, há uma questão para a qual não encontro resposta imediata e não sei se por curiosidade se por horizontes reduzidos, não entendo muito bem quando dizes «só é pena que, depois de se morrer, não se possa voltar atrás. afinal, sempre teria sido possível, não é?». Se acharmos que tudo é possível a tentação será sempre maior, ou não?

«Parar é morrer»... não necessariamente. Ou pelo menos há muito sumo que podes tirar desta laranja. Se tivermos a falar do parar físico e o associarmos também ao ''morrer físico'', sim, parar é morrer. A questão, e vendo as coisas como uma católica-praticante-e-com-injecções-de-religião-e-moral-diariamente (recuei no tempo e peço desculpa aos crentes que sabem que agora isso tudo surge com um grande ''ex-'' inicial..), esse morrer não existe e há muito mais para além dessas dúvidas que a física, e a filosofia e a geografia ousam responder. A tendência é sempre pegar nelas quando tocamos num assunto destes, por preguiça ou por falta de argumentos. E sinto-me como se tivesse a discutir o sexo dos anjos portanto, como penso não ser esse o tema principal do texto não debaterei mais sobre este assunto, senão corro o risco de as divagações falarem mais alto.
Quanto ao ponto de interrogação que se coloca relativamente à tristeza, nem sempre as coisas são abstractas. O que muitas vezes é abstracto é o que antecede esse sentimento, nomeadamente actos, palavras, expressões etc. E o ponto fulcral está mesmo aí e milhentas e uma perguntas surgem na nossa cabeça: porquê? mas como? e agora? E a nossa língua enrola-se e deixamos fluir uma série de promessas (quase todas inúteis - QUASE -) que nem nós próprios entendemos ou acreditamos. Mesmo assim, e apesar do «incomodozinho» ou do bad feeling (muitas vezes banalizado) ou do que quer que seja que temos cá dentro, estar triste não é necessariamente parar e consequentemente morrer. É preciso estar triste. É preciso pensar.

m disse...

É preciso recuar. É preciso querer relembrar muita coisa. É preciso saber distinguir outras tantas. É preciso sentir tudo, especialmente o que aconteceu, especialmente o que nos deixa tristes. É verdade que quando estamos em dias maus, muito maus, a nossa mente reduz-se a insignificantes casos de esperanças um dia bem vivas e coloridas que numa bela manhã de sol foram rasgadas cruelmente. E derramamos lágrimas ou de saudade ou de dor ou uma mistura dos dois. E dizemos, estou triste. E não há nada mais irritante do que ouvir, haverá dias melhores. (apesar da boa intenção expressa...) Sim, com certeza, mas quando? É indiscutível que o ser humano quer ter sempre uma ligeira noção do tempo...
Não há nada que possamos fazer para não ficarmos tristes porque as forças e a energia sao sugadas em tempo indefinido e ficamos como que cegos. E se não estamos tristes em frente dos que mais amamos, estamos tristes quando estamos sozinhos. E se sorrimos para esconder a tristeza, choramos por estarmos a sorrir porque essa é uma tentativa (para nós proprios!!!) de ficarmos bem (e siim, tentamos!!!!) A questão é que se queremos sentir a felicidade,também queremos sentir a tristeza: equilíbrio (am i right?) E isso não significa solucioná-la porque nem sempre sabemos a solução. E não saber não é ficar parado e consequentemente morrer. É antes pensar e analisar e tentar não cair nos erros, mesmo que sejam eles os nossos maiores mestres. Se puderes evitar ''ferimentos graves'' porque raio é que não evitamos?

E toda esta lengalenga para dizer que por vezes precisamos de parar. E talvez até morrer. Não importa por quanto tempo. (Arriscaria dizer que isso é meramente biológico.) O importante é consciencializar-se do fruto desse intervalo. É esperar que no final dessa pausa consigamos traduzir tudo na nossa língua, percepcionar o mundo com outros olhos e moldar os sentidos consoante as nossas crenças e maneiras de ver as pessoas. Se mudarmos alguma coisa (mesmo que seja só para nós mesmos) então essa pausa valeu a pena, essa morte valeu ainda mais. E ninguém consegue decifrar isto. Nem eu, nem tu. E não é ''esperar que as coisas caiam do céu''. É simplesmente esperar pelos timings (mesmo sabendo que estes nos fogem das mãos como a areia por entre os dedos)...

Beijo

(ps: desculpa a seca e a confusão
ps2: por acaso os comentários têm limite de tamanho..nao consegui por tudo num :( - muahahah :p)

. disse...

querida marta

obrigado pelos teus dois (gigantescos :O) comentários. mereces as respostas todas. primeiro:

"afinal, sempre teria sido possível" adormecer, não ressuscitar. não que ponha as minhas mãos no fogo pelo impossível, mas até agora toda a gente lá ficou, a não ser num único caso, e bem duvidoso ahah. a questão é que quem teve força suficiente para se suicidar teria certamente para dar a volta seja ao que for (then again, há situações muito más - lembra-te do million dollar baby, por exemplo)

segundo:
(aprendeste bem ahah) sim, é preciso estar triste e sim, é preciso pensar. sem dúvida alguma. no entanto, repararás que não é a tristeza que faz parar. nem o pensamento. nem a dúvida. o que faz parar é a falta de esperança naquilo que se sente por aquilo que é racional. aquilo que faz parar é deixar que venham todas as respostas de fora. aí, ficamos estagnados. parados. gelamos e morremos (e não podes mesmo).

terceiro: so right :))
e mais uma vez. não é o não saber que faz ficar parado e morrer. é o não saber saber. é o só ter a razão, é o não sonhar, não intuir, não arriscar.

quarto: aí é que chegaste ao fulcro da questão :D
repara no título. a tristeza não é uma doença. a tristeza é parte de um ciclo necessário, juntamente com a alegria. acordar e adormecer. a metáfora não é coincidência. ainda assim, a tristeza será sempre negativa (e repara que não é má, é negativa) e a alegria positiva. e nós, seres humanos, sentimo-nos frequentemente (no mínimo) tentados aclassificar de bom aquilo que é positivo e mau o negativo. precisamos dos dois, no entanto tentamos fugir do negativo.

repara, a depressão é como uma insónia, da mesma maneira que a euforia é como um coma. perturbam o equilíbrio, interrompem o ciclo. e isso é que é mau. porque o ciclo é movimento e o movimento é vida. o problema não é parar, é ficar parado. 1ª lei de newton.

quinto: não peças desculpa por uma coisa que ainda nem publicaste. se te sentisses culpada, tinhas mudado.

obrigado pelo interesse :)

beijo

Maria Francisca disse...

Querido (ainda não sei se é querido ou querida, visto que faltam 4 dias para a sondagem acabar. Mas acho que é querido), eu acho que sou a mais pequena. As coisas não precisasm de ser assim. Não deveriam.
È por isso que eu não páro. A parte em que dizes: "Porque aprendemos que o céu é em cima, disse a geografia, e é difícil ir para cima por causa da gravidade, disse a física, e será que o céu existe?, disse a filosofia, e já estragou tudo." fiquei completamente espantada. Que ideia genial.
(Não quero comentar o resto do texto porque o suícidio é algo que me está muito próximo e percebo o que dizes nisto. Mais que perceber, sinto-o.)
Beijinhos.

Unknown disse...

Bom dia aos seguidores e autor deste blog tão controverso e profundamente verdadeiro...
O tema do teu post é sem dúvida muito polémico no sentido que é um tema forte, sentido e sempre presente do nosso quotidiano...

Neste momento não me importava de adormecer... Mas tendo a certeza de que iria sonhar e ser realmente livre...
Às vezes é difícil viver neste sítio... Mas mais difícil é vivermos muitas vezes connosco próprios...

Sabes espelho meu é impressionante a pertinência com que escolhes os temas para abordar e principalmente a forma como os expões. Porque quem os lê à 1ª vista parecem confusos e imperceptíveis mas depois... Bem depois encontramo-nos connosco nesta viagem que são as palavras bem escritas e com muito sentido...

b disse...

Não muito a escrever - você já conhece.
Sangue circula , a Terra gira e a vida se conhece pelo movimento - seja lá que movimento for.
Do caos que a tristeza causa - move-te em dor mas move-te porque a parada não obrigatória é a maior das cegueiras.
"O que não nos mata nos deixará mais fortes" e a vida vive nos matando.
Mas que seja dela a supremacia da decisão.

Blog Dri Viaro disse...

Oi!!

Passei pra conhecer seu blog, e desejar boa semana

bjs

aguardo sua visita :)